Por Mariane Rodrigues.
Todos os 21 alagoanos que foram resgatados de trabalhos análogos à escravidão no Espírito Santo, nesta semana, já estão em Penedo, cidade do Baixo São Francisco de Alagoas. Eles chegaram nesta sexta-feira (17) em dois grupos. O primeiro chegou nas primeiras horas do dia, com 12 pessoas. Já o segundo, com nove trabalhadores no final da tarde.
Um dos trabalhadores que já teve o alívio de chegar a casa dos familiares é Stefano Júlio. Ele estava no mesmo grupo da cozinheira Wagna da Silva, de 43 anos, que gravou o vídeo relatando estarem vivendo em situações precárias, com dívidas que não paravam de crescer.
Em entrevista à TV Gazeta, ao lado da mãe, Stefano diz que ainda está processando tudo que viveu, mas afirma estar aliviado por ter voltado para a família.
“E difícil conter as emoções diante de tanta informação, diante de tudo que a gente passou e estamos passando ainda, porque é um processo longo e demorado, mas é, ao mesmo tempo, aliviante estar em casa com nossos familiares. Receber um abraço, o apoio”, disse Stefano Júlio.
A mãe Maria Eliane diz que está “até sem palavras” por imaginar a situação vivida pelo filho.
“Emoção que toda mãe sente, porque você saber que seu filho está ali no cativeiro, ameaçado, com tanta gente má, porque a pessoa não quer que você saia de lá, uma dívida crescendo, os meninos vendo que não podiam pagar, eu fico até sem palavras”, desabafa a mãe de Stefano, Maria Eliane.
Doze trabalhadores, sendo 11 homens e uma mulher, saíram de Penedo no início de maio para trabalhar na colheita de café, em uma propriedade localizada na cidade de Brejetuba, no interior do Espírito Santo. Eles teriam que conseguir um valor diário para que pudesse pagar ao proprietário o débito das passagens e, depois, fazer o próprio dinheiro para viver no local.
No entanto, eles relatam que, ao chegar na fazenda, a estrutura era precária, eles dormiam no chão, em ambiente insalubre e não encontraram colheita suficiente para pagar as dívidas.
A única mulher do grupo, Wagna Silva, diz que eles não foram ameaçados com armas e por pouco não passaram fome, mas receberam ameaças se não pagassem as dívidas.
“A partir de sexta-feira, quando ele [o chefe] falou que os meninos podiam ir, mas ele colocaria a polícia atrás e era para pagar de uma maneira ou de outra, eu já comecei a ficar preocupada, porque, no meu ponto de vista, foi uma ameaça que ele fez. E, quando foi no dia que eu gravei o vídeo, já gravei devido a isso, dei uma pesquisada e li muito na internet o que era trabalho escravo”, afirmou a mulher.
Após eles gravarem o vídeo, uma força-tarefa foi montada, envolvendo o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), por meio da superintendência em Alagoas; o Ministério Público do Trabalho, auditores fiscais, a Polícia Federal, e a Secretaria de Assistência Social de Penedo.
A mesma força-tarefa também conseguiu resgatar um segundo grupo, que pediu ajuda após a divulgação do vídeo dos 12 primeiros.
Eram mais nove trabalhadores de Penedo, todos homens, que estavam em condições semelhantes, na cidade de Governador Lindenberg, no Espírito Santo.
Conforme relatado pela Superintendência Regional do Trabalho e Emprego em Alagoas, as condições de trabalho para esse novo grupo eram ainda mais precárias do que as do caso anterior.
Os nove alagoanos foram para o ES com a promessa de receber R$26 para cada saca colhida. No entanto, o intermediário, conhecido na área rural como “gato”, retinha R$ 14 dos valores devidos a eles. Além disso, eram descontadas 10 sacas por quinzena de cada empregado para pagar a cozinheira, resultando na retenção dos trabalhadores por dívidas.
Durante a fiscalização, constatou-se que os trabalhadores não se alimentavam há dois dias, subsistindo apenas com um pouco de arroz obtido de vizinhos. Após o resgate, foram encaminhados para Colatina, situada a 74 km de Governador Lindenberg, onde receberam abrigo e alimentação até o retorno a Penedo.
Após a operação, o empregador foi convocado pela fiscalização para realizar o pagamento dos direitos rescisórios e também providenciou o transporte, conforme previsto na legislação. Ademais, o empregador foi autuado para pagar uma multa e enfrentará um processo criminal conforme o artigo 149 do Código Penal Brasileiro.
Agora, Stefano Júlio diz que busca “qualquer emprego” na sua cidade de origem. “A gente espera conseguir um trabalho. Qualquer trabalho. O que importa é que a gente esteja empregado e que a gente possa dar um conforto melhor para nossa família e para que a gente não sofra isso no futuro”, diz Stefano.
Já Wagner afirma que agora está “sossegada” na casa dos familiares.
“Uma sensação maravilhosa de a gente estar na cidade da gente, acolhida pela família, em casa, sossegada, sem se preocupar, sem estar com medo”, Wagna.
A Secretaria de Assistência Social de Penedo disse que eles foram cadastrados para receber atendimento assistencial. Eles serão acompanhados pela equipe técnica do Creas (Centro de Referência de Assistência Social).
A prefeitura diz ainda que vai trabalhar na inserção desses trabalhadores em cursos profissionalizantes para posterior reinserção no mercado de trabalho. A intenção, segundo o município, é de encaminhá-los para os programas sociais do município.
Redação com Gazeta Web