A União Europeia informou nesta segunda-feira (26) estar “consternada” com o decreto, que foi “mais um golpe” contra os direitos das mulheres e meninas no Afeganistão. O texto cria “outro obstáculo para a normalização das relações” entre o Afeganistão e a UE, observou Bruxelas em um comunicado. O reconhecimento europeu do regime Talibã só será possível se Cabul “respeitar totalmente suas obrigações internacionais e com o povo do Afeganistão”, advertiu o bloco europeu.
A missão da ONU no Afeganistão também disse no domingo (25) que estava “preocupada” com a lei que acaba de ser ratificada no país asiático. “Após décadas de guerra e em meio a uma terrível crise humanitária, o povo afegão merece muito mais do que ser ameaçado ou preso se chegar atrasado para a oração, olhar para uma pessoa do sexo oposto que não seja membro de sua família ou possuir uma foto de um ente querido”, disse Roza Otunbayeva, chefe da Missão de Assistência das Nações Unidas no Afeganistão (UNAMA). “Essa é uma visão preocupante do futuro do Afeganistão”, disse ela.
Interpretação da lei islâmica
A nova lei de 35 artigos, anunciada na quarta-feira (21), reforça restrições já em vigor no país, controlando todos os aspectos sociais e privados da vida dos afegãos, em uma interpretação extrema da Sharia (lei islâmica). O texto impõe normas que vão desde a vestimenta até a interação social, incluindo as roupas e o comprimento da barba dos homens, a proibição da homossexualidade, de música em locais públicos e de feriados que não estejam no calendário religioso muçulmano. Adultério, uso de drogas e prática de jogos de azar, assim como a criação ou visualização de imagens de seres vivos no computador ou no celular também fazem parte das proibições.
Mas as mulheres são as mais atingidas com as novas regras. O texto estipula que elas devem cobrir seus rostos e corpos quando saírem de casa e garantir que suas vozes não sejam ouvidas.
Segundo a lei, a partir de agora as mulheres não podem mais falar, cantar ou recitar poesias em público. Elas também deverão manter seus rostos cobertos “por medo da tentação” e os motoristas que as transportar sem véu, desacompanhas ou com homens que não pertençam à família também serão punidos, o que limita ainda mais os movimentos das afegãs.
“Apartheid de gênero”
O texto, promulgado três anos após a volta do Talibã ao poder, prevê penas graduais, que vão de advertências verbais e multas até detenções de duração variável. As medidas serão controladas pela polícia da moralidade do Ministério da Propagação da Virtude e Prevenção do Vício (PVPV).
As autoridades do Talibã sempre rejeitaram as críticas internacionais feitas principalmente contra as restrições visando as mulheres, consideradas pelas Nações Unidas como uma forma de “apartheid de gênero”. No entanto, os representantes do regime reagiram aos comentários sobre a nova lei alegando que o texto será aplicado “com moderação”.
“Devo deixar claro que a força e a opressão não serão usadas na aplicação dessas regras”, declarou nesta segunda-feira (26) o porta-voz adjunto do governo, Hamdullah Fitrat, em uma mensagem de voz compartilhada com as agências de notícias. Segundo ele, as regras “serão aplicadas com cuidado, apelando para a compreensão das pessoas e as orientando”.