De Teerã – Luiz Carlos Azenha
O aiatolá Khamenei, líder espiritual do Irã, rejeitou nesta quarta-feira (3) a proposta dos Estados Unidos de um acordo nuclear em que seu país seja impedido de processar urânio livremente.
Foi durante o discurso anual para relembrar a morte de seu antecessor e fundador da República Islâmica do Irã, aiatolá Khomeini.
O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, já disse que impedirá o Irã a qualquer custo de construir um artefato nuclear. Khamenei, por sua vez, considerou o domínio do Irã sobre o ciclo completo e honroso do combustível nuclear como resultado da crença do povo e dos jovens cientistas no lema “nós podemos”.
“Uma grande indústria nuclear sem enriquecimento é praticamente inútil. Os EUA e o regime sionista devem saber que não conseguirão de forma alguma atingir seu principal objetivo de acabar com a indústria nuclear do Irã”.
Atualmente, EUA e Irã negociam através de intermediários. As relações diplomáticas estão rompidas desde a revolução de 1979, quando Khomeini derrubou a monarquia pró-estadunidense do Xá Reza Pahlevi.
O Ocidente sanciona a economia iraniana desde 1984. Em seu discurso, Khamenei questionou o direito dos Estados Unidos de ditar o futuro do Irã e se referiu às “sanções abrangentes que ainda persistem, ao ataque militar americano a Tabas e ao abate de um avião de passageiros iraniano sobre o Golfo Pérsico” como outras ações malignas dos inimigos do povo e da Revolução.
“Por trás de todas essas conspirações estavam os governos arrogantes, especialmente os EUA e o regime sionista, bem como as agências de espionagem como a CIA (EUA), MI6 (Reino Unido) e o Mossad (regime sionista)”.
Ele remeteu sua fala aos princípios da revolução islâmica, na qual Khomeini enfatizou como uma das prioridades a independência nacional. Khamenei falou diante de milhares de apoiadores na mesquita onde fica o mausoléu de Khomeini.
“Trinta e seis anos após o falecimento daquele grande homem, sua presença e os efeitos de sua revolução são evidentes em questões como o declínio das grandes potências, o surgimento de um sistema multipolar, a severa queda no prestígio e influência dos EUA, o aumento do ódio ao sionismo, inclusive na Europa e nos EUA, e o despertar de muitas nações rejeitando os valores ocidentais”, disse.

“Abaixo os EUA”
No prédio, de arquitetura espetacular, ecoaram os gritos de “abaixo os Estados Unidos” e “abaixo Israel”, com os quais a multidão pontuou momentos chave do discurso de Khamenei.
Ele reafirmou que o Irã domina todo o ciclo nuclear, da exploração das minas de urânio ao processamento e enriquecimento.
O Irã vive um feriado de três dias para relembrar Khomeini e o discurso de Khamenei foi transmitido ao vivo para o país.
Ele usou uma metáfora para explicar a rejeição iraniana à proposta dos Estados Unidos: é como se o Irã tivesse petróleo mas não pudesse construir refinarias.
Ao longo dos últimos anos, o Ocidente insiste em limitar o enriquecimento de urânio no Irã com o objetivo de impedir que o país construa bombas atômicas.
Khamenei afirmou que o esquema de enriquecer urânio fora do Irã para fins pacíficos, para fornecê-lo posteriormente a Teerã, já foi tentado e fracassou nos anos 80 do século passado.
Ele enfatizou que o domínio do ciclo completo do átomo tem uso não apenas na produção de energia elétrica e em diagnóstico e tratamento médicos, mas relação com outras tecnologias necessárias à soberania do Irã.
Acesso ao arsenal
No dia anterior ao discurso, o Irã permitiu acesso a jornalistas estrangeiros, inclusive da revista Fórum, ao Centro Aeroespacial do país onde ficam modelos de mísseis e drones de última geração.

Recentemente, o Irã disparou mísseis balísticos de longo alcance que atingiram Israel. Há indícios de que conseguiram superar a defesa anti-aérea israelense, conhecida como Domo de Ferro.
No discurso, Khamenei relembrou que, quando da revolução de 1979, o Irã não tinha equipamentos próprios de Defesa.
Em 1980, apoiado pelo Ocidente, Saddam Hussein atacou o Irã, numa guerra sangrenta de oito anos entre os vizinhos durante a qual o Iraque atingiu a capital iraniana com mísseis Scud fornecidos pela França.
Desde então e apesar do boicote ocidental, o Irã desenvolveu seus próprios mísseis, tecnologia nuclear e colocou alguns satélites em órbita da terra.
Khamenei referiu-se a isso no discurso. “Que diabo querem os Estados Unidos”, afirmou o líder espiritual, sobre a presença estadunidense no Oriente Médio.

Irã “enfraquecido”
A Casa Branca acredita que o Irã ficou enfraquecido desde a resposta de Israel ao ataque do Hamas em 7 de outubro de 2023.
Tel Aviv praticamente desmantelou o Hamas em territórios palestinos e o Hezbollah no Líbano, aliados do Irã no chamado Eixo da Resistência.
Além disso, com a troca de regime na Síria, o Irã perdeu um aliado vizinho a Israel.
Em seu discurso, Khamenei denunciou o genocídio em Gaza dizendo que Israel agora usa metralhadoras para economizar bombas ao matar palestinos. Ele faz referência a Israel apenas como um instrumento regional dos Estados Unidos.
“Criam um centro para distribuição de alimentos e depois metralham o povo. Esse nível de baixeza, maldade, crueldade e perversidade é realmente espantoso. É por isso que insistimos que os Estados Unidos devem deixar esta região”, afirmou
A fala de Khamenei aconteceu em meio a extremas medidas de segurança. Jornalistas estrangeiros foram impedidos de entrar com qualquer objeto, inclusive papel, lápis ou canetas.
Há alguns meses, um líder do Hamas foi assassinado em plena Teerã supostamente pelo serviço secreto israelense. Israel também explodiu, de maneira simultânea, através de um sinal eletrônico, os pagers que eram utilizados por militantes do Hezbollah no Líbano.
Por isso, o uso da internet por jornalistas estrangeiros ficou limitado no Irã nos últimos dias.
Se havia um objetivo por trás do convite para que assistissem ao discurso de Khamenei hoje foi o de mandar a mensagem de que o Irã pretende e tem condições de resistir às demandas do governo Trump na questão nuclear.
Redação C/ Revista Fórum
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