Anadia/AL

17 de novembro de 2025

Anadia/AL, 17 de novembro de 2025

Auditoria no Corinthians constata desvios de materiais da Nike e põe vice como figura central

Em relatório, Armando Mendonça retirou 131 itens entre junho e outubro, e funcionário chegou a ser flagrado vendendo material. Timão não tinha quantidade de camisas 1 para jogar contra Flu

ABN - Alagoas Brasil Noticias

Em 17 de novembro de 2025

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Foto: Reprodução / GE

Por: Bruno Cassucci e Gabriel Oliveira

Uma auditoria realizada no Corinthians  identificou uma série de irregularidades na gestão dos materiais esportivos fornecidos pela Nike, com a retirada de itens excedendo em quase 300% a cota anual prevista em contrato.

Por outro lado, times das categorias de base e de outros esportes utilizam uniformes em condições precárias ou nem sequer os recebem.

Foram identificadas sete ocorrências que o relatório, obtido pelo ge, classifica como graves:

  • Acúmulo de materiais esportivos de coleções anteriores, armazenados por longos períodos sem destinação definida;
  • Parte dos uniformes enviados pela Nike não é devidamente distribuída aos departamentos e modalidades esportivas do clube;
  • Ausência de inventário físico formal no almoxarifado do Parque São Jorge há mais de quatro anos;
  • Notas fiscais de recebimento não lançadas no sistema, ocasionando inconsistências contábeis e exposição a riscos fiscais;
  • Distribuição desigual de uniformes entre diretores, funcionários e atletas, aliada à falta de planejamento nos pedidos à Nike;
  • Retirada de materiais antes da conclusão do fluxo completo de aprovações, contrariando o controle interno previsto e enfraquecendo o processo de governança;

Retirada de materiais por solicitantes incorretos, o que fragiliza o controle de responsabilidade e dificulta a rastreabilidade de consumo por área ou modalidade.

  • O relatório da investigação coloca o vice-presidente Armando Mendonça, responsável pela administração dos materiais no clube, no centro de parte das ações consideradas como inconformidades, como a retirada direta de itens sem registro formal ou autorização prévia.

O documento aponta que Mendonça “demonstrou tom de preocupação em relação ao andamento dos trabalhos de auditoria” e usou “expressões de natureza agressiva e alusões interpretadas como ameaças” em conversas com o diretor de Tecnologia do Corinthians, Marcelo Munhoes, responsável por comandar a auditoria.

O vice-presidente respondeu ao ge que não é responsável pelas diretrizes de distribuição dos materiais da Nike, que solicita constantemente melhorias no controle de retirada dos itens, que usa produtos para ações de relacionamento, que não fez ameaças e que o relatório é tendencioso (leia o posicionamento completo ao fim do texto).

Também procurada pelo ge, a diretoria do Corinthians não se manifestou até a publicação desta reportagem.

Estouro da cota em 297%

O Corinthians  obteve 41.963 itens da Nike em 2025, até 10 de outubro — número 24% maior do que o volume registrado no ano passado, de 33.902 produtos.

Somando os itens destes dois anos, o Timão recebeu R$ 23.772.090,37 em materiais esportivos. Esse valor ultrapassa em R$ 15.772.090,37 o limite de cota contratual, estabelecido em R$ 4 milhões anuais, representando excedente de cerca de 297% no período.

A Nike não cobra pelos itens pedidos a mais.

Almoxarifado do Parque São Jorge — Foto: Reprodução

Almoxarifado do Parque São Jorge — Foto: Reprodução

Do total de itens recebidos em 2025 até o momento, 64% foram destinados ao almoxarifado do Parque São Jorge, que atende futebol feminino, futebol de base, esportes terrestres, corporativo (administrativo, diretoria e presidência) e marketing.

O Corinthian tem outro almoxarifado, no CT Joaquim Grava, que atende o futebol profissional masculino e a diretoria.

O descontrole na gestão dos itens também é expresso no valor total de R$ 6,4 milhões em notas fiscais não lançadas no sistema do clube em 2024 e 2025.

— O não lançamento de notas fiscais no sistema constitui não conformidade grave, comprometendo o controle interno e fluxo de informações a acuracidade dos saldos sistêmicos dos materiais e riscos de exposição fiscal — detalha o relatório.

Condições precárias na base

Mesmo com a expressiva quantidade de materiais retirados junto à Nike, a auditoria constatou que a “grande maioria das modalidades esportivas do clube não foi contemplada pela uniformização oficial da fornecedora”.

Segundo o relatório, determinados departamentos “não estão recebendo as quantidades necessárias para suprir suas demandas de treino, viagem e competições”. Os representantes de esportes aquáticos, por exemplo, estão sem receber uniformes oficiais.

Em contrapartida, o clube tem comprado materiais esportivos licenciados, com o objetivo de fornecê-los a determinados departamentos, como futsal e basquete de base, o que o relatório aponta que gera custos desnecessários, uma vez que os fornecimentos da Nike não resultam em despesas ao Corinthians. O clube gastou R$ 776 mil na compra de 13.503 itens licenciados.

Nas categorias de base, somente o time sub-20 recebeu uniformes completos de treino da coleção 2025. Os outros times não foram contemplados adequadamente, segundo o relatório.

O departamento de base chegou a ser orientado a “racionar o uso dos materiais esportivos sob a justificativa de que não haveria quantidade suficiente para atender às demandas da Copa São Paulo de Futebol Júnior”.

O relatório aponta que, nas divisões inferiores, como sub-12 e sub-13, o Corinthians utiliza os modelos de 2019 para treinamento e os de 2021 para jogos.

A auditoria verificou ainda que muitos materiais do futsal, tais como camisas e calças, estão em condições precárias, “apresentando desgaste acentuado pelo tempo e utilização prolongada, além de costuras, remendos, rasgos e desbotamento da malha”.

Falta de camisas no profissional

O relatório chama atenção para uma ocorrência em que o Corinthians precisou mudar o uniforme que utilizaria em partida contra o Fluminense, no Maracanã, no Campeonato Brasileiro, em razão da falta de camisas no estoque.

Segundo a auditoria, às vésperas da partida, em 13 de setembro, o clube percebeu que não havia quantidade suficiente de camisas brancas para compor o uniforme principal.

Como a Nike não conseguiria entregar o material a tempo em caráter de urgência, o Corinthians  teve de pedir à diretoria do Fluminense para que a partida ocorresse com as duas equipes utilizando o seu segundo uniforme. Os rivais atenderam a solicitação.

Corinthians pediu ao Fluminense para jogarem com uniformes reservas por não ter camisas brancas suficientes — Foto: Marcelo Gonçalves/Fluminense

            Foto: Marcelo Gonçalves/Fluminense

Comercialização de materiais

A partir de uma denúncia anônima, a auditoria constatou a ocorrência de comércio clandestina de materiais pertencentes ao clube, tanto dentro quanto fora das suas dependências.

Funcionários do Corinthians  estariam intermediando a venda de produtos da Nike oriundos do estoque institucional, o que acabou sendo comprovado.

Um funcionário do clube, flagrado vendendo materiais desviados a R$ 150,00 e R$ 180,00 por peça, reconheceu participação no esquema, segundo a auditoria. Ele não é identificado no relatório.

Vice-presidente no centro

O relatório aponta situações em que Armando Mendonça, vice-presidente e responsável pela gestão dos materiais esportivos desde maio deste ano, quando o presidente Osmar Stabile assumiu o cargo, teve ações consideradas como inconformidades.

A auditoria constatou que normalmente são requisitadas de seis a 11 camisas adicionais por jogo, em nome da rouparia, a título de “relacionamento da diretoria”. O principal destinatário dessas camisas é o vice-presidente.

Segundo o relatório, Armando ainda pediu para si as 19 camisas especiais remanescentes da partida entre Corinthians e Palmeiras, em 31 de agosto, com patches da NFL, em homenagem ao jogo que seria realizado na semana seguinte na Neo Química Arena.

O relatório descreve que, ao saber que a auditoria estava ciente, o vice-presidente cancelou o pedido, mas que, depois, efetuou a retirada de oito peças, “sem a devida formalização do processo de solicitação no sistema”.

Em uma inspeção na rouparia do CT, a auditoria constatou que Armando “realizou retiradas diretas de materiais esportivos pertencentes à rouparia, sob a alegação de empréstimo temporário, sem registro formal ou autorização prévia”.

Ao analisar as solicitações de materiais pela diretoria, a auditoria verificou que, entre 6 de junho e 30 de outubro de 2025, o vice-presidente pegou 131 itens – não incluídas nesta conta as camisas para “relacionamento” em dias de jogo. Foram identificadas retiradas sem a devida formalização documental.

O relatório ainda aponta que houve transferência de materiais que haviam sido considerados insatisfatórios, do CT para o almoxarifado do Parque São Jorge, por ordem de Armando, “sem a emissão de qualquer documento fiscal ou contábil que respaldasse a transferência”.

Ameaças do vice-presidente

O relatório aponta que, durante a investigação, o vice-presidente teve duas conversas com Munhoes, diretor de Tecnologia e responsável pela auditoria, nas quais “demonstrou tom de preocupação em relação ao andamento dos trabalhos”.

Conforme o relato, em determinado momento, “o diálogo assumiu caráter mais incisivo, com expressões de natureza agressiva e alusões interpretadas como ameaças, dirigidas ao auditor”.

Armando Mendonça, vice-presidente do Corinthians — Foto: Emilio Botta

          Foto: Emilio Botta

Houve ainda, de acordo com o relatório, uma situação em que Armando entrou sem ser convidado em uma reunião com o responsável pelo atendimento da Nike ao Corinthians.

— Foi observada postura tendenciosa e tentativa de condução unilateral por parte do Sr. Armando Mendonça, que formulava perguntas e respondia-as ele próprio, gerando constrangimento e intimidação aos demais presentes.

Nas considerações finais, a auditoria informou ter identificado “falhas processuais relevantes nos controles de armazenamento e na destinação de materiais esportivos Nike, além de fragilidades nos fluxos de aprovação e na rastreabilidade das solicitações”.

— Apurou-se a existência de processos não conformes, como retiradas de materiais antes da conclusão dos trâmites formais, ausência de registros sistêmicos completos, e suspeitas de comercialização indevida de itens pertencentes ao clube, algumas delas com indícios de envolvimento de colaboradores.

— Observa-se também a expressiva quantidade de materiais esportivos que o clube recebe anualmente da Nike, atingindo patamares significativamente superiores ao previsto contratualmente, somando-se ainda os uniformes licenciados adquiridos pelo próprio Corinthians.

— Ainda assim, verificou-se que diversas modalidades esportivas do clube permanecem sem a devida uniformização, revelando uma distribuição desigual e ineficiente dos recursos disponibilizados.

Além de listar as irregularidades constatadas, o relatório apresentou 17 recomendações de melhorias dos processos internos.

Cópias do relatório foram enviadas ao presidente Osmar Stabile, que havia solicitado a investigação interna, e ao presidente do Conselho Deliberativo, Romeu Tuma Júnior, bem como à Polícia Civil, que tem um inquérito criminal em andamento sobre o mesmo assunto.

Posicionamento de Armando Mendonça

Em resposta a três perguntadas enviadas pelo ge, o vice-presidente do Corinthians se manifestou com os seguintes posicionamentos:

É falsa a informação de que sou o responsável pelas diretrizes de distribuição dos materiais da Nike no Corinthians e administração dos almoxarifados.

Por conta do caos encontrado em junho deste ano, quando a gestão Augusto Melo não fazia o necessário controle e, em janeiro de 2025, já havia estourado em muito a cota anual, resolvi pessoalmente ajudar no sistema de cadeia de aprovações de retirada de material, justamente para dar maior transparência e controle à destinação do patrimônio do clube e evitar prejuízos e malfeitos.

Desde então, solicito constantemente melhorias no sistema para o fluxo de controle de retirada de materiais Nike.

É preciso salientar que não é nem nunca foi de minha responsabilidade a definição de política de distribuição interna por departamento, o que normalmente é feito a cada ano.

Minha função é a de analisar os pedidos extras e autorizá-los de acordo com as necessidades, juntamente com o departamento administrativo.

Lamento profundamente informações desconectadas da verdade e desamparada de qualquer material probatório.

No mais, sempre prestigiarei melhorias, maior controle e apuração correta de irregularidades.

Sobre a retirada direta de materiais, o dirigente declarou:

Como mencionei, solicito reiteradamente melhorias no sistema que controla os materiais oficiais. Rotineiramente, o Corinthians utiliza uma quantidade mínima de materiais para ações de relacionamento com outras agremiações, patrocinadores e players importantes do futebol brasileiro. Todos os pedidos são encaminhados por e-mail e formalmente registrados internamente. Este relatório é tendencioso e vai na contramão do profissionalismo que buscamos implementar no Corinthians.

Quanto à suposta interferência na investigação, Armando negou a acusação:

Mais uma mentira. Internamente, tenho discordâncias em relação a processos do clube, o que é normal dentro de uma gestão. Nunca houve falta de respeito da minha parte, essa foi uma das razões para que eu entrasse com uma notificação extrajudicial.

ABN C/ GE

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