🛑 Flavia Said
Com a isenção do imposto de importação de um grupo de alimentos, válida desde sexta-feira (14/3), o governo Lula (PT) aposta em deixar a comida mais barata no prato dos brasileiros. A medida vai durar por prazo indeterminado, mas o vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB) afirmou que ela é “temporária” e “emergencial”.
Os reais impactos na economia ainda são incertos. Especialistas avaliam que a eliminação do imposto de importação pode ter impacto pouco perceptível nos preços repassados ao consumidor.
A inflação, em especial dos alimentos, segue pressionando. Segundo dados divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) na última quarta-feira (12/3), os preços de bens e serviços do país subiram 1,31% em fevereiro, maior taxa para o mês desde 2003. O grupo Alimentação e bebidas teve alta de 0,70%, atrás apenas de Educação (4,70%) e Habitação (4,44%).
Itens que tiveram o imposto de importação zerado
Carnes desossadas de bovinos, congeladas (passou de 10,8% a 0%)
Café torrado, não descafeinado, exceto café acondicionado em cápsulas (passou de 9% a 0%)
Café em grão, não torrado, não descafeinado (passou de 9% a 0%)
Milho em grão, exceto para semeadura (passou de 7,2% a 0%)
Azeite de oliva (oliveira) extravirgem (passou de 9% a 0%)
Açúcares de cana (passou de 14,4% a 0%)
Massas alimentícias, não cozidas, nem recheadas, nem preparadas de outro modo (passou de 14,4% a 0%)
Bolachas e biscoitos (passou de 16,2% a 0%)
Óleo de girassol, em bruto (passou de 14,4% a 0%)
Em relação à sardinha, a alíquota foi zerada dentro de uma cota de 7,5 mil toneladas.
Também foi decidido pelo aumento da cota do óleo de palma, cuja alíquota já era zerada. A cota passou de 60 mil toneladas para 150 mil toneladas, pelo prazo de 12 meses.
Outra medida adotada pelo governo federal foi facilitar o processo de inspeção que verifica, por exemplo, as condições sanitárias dos produtos comercializados. A mudança permitirá que produtos de origem animal, como leite líquido, mel e ovos, inspecionados nos municípios possam ser comercializados em todo o país, sem necessidade de certificação também pelo Sistema Brasileiro de Inspeção de Produtos de Origem Animal (SISBI-POA).
Além disso, o governo apelou a estados para isentarem produtos da cesta básica do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), de competência estadual.
“A redução de tributos pode influenciar o custo final, mas depende da relevância desse imposto na formação do preço. No caso do imposto de importação, como o volume das mercadorias beneficiadas pelo novo pacote não é significativo, o reflexo tende a ser limitado”, explica a advogada Salwa Nessrallah, especialista em direito tributário.
Outro ponto analisado por Nessrallah é um possível impacto negativo na produção nacional, como já vem sido manifestado pela bancada ruralista no Congresso. “O risco ocorre quando há um volume expressivo de importação, o que poderia prejudicar produtores locais. No entanto, como os produtos incluídos na medida não representam grande parte das importações, o efeito sobre o mercado interno deve ser reduzido”, afirma.
Para o agronegócio nacional, as medidas do governo federal para conter inflação de alimentos são ineficazes. A Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA) argumentou que a redução mais eficiente para combater a inflação de alimentos é a colheita da safra brasileira que ocorre nos próximos meses e a correção de ações que impactam diretamente o custo de produção no Brasil.
A FPA também salientou que o governo não se preocupou em garantir o reforço ao apoio da produção brasileira. O governo monitora os preços dos alimentos antes de lançar o Plano Safra 2025/2026, que oferece financiamento para aquisição de insumos e equipamentos para o setor agrícola. No ano passado, o programa destinou R$ 400,59 bilhões a linhas de crédito.
Isenção do ICMS
O governo também vem apelando no sentido de que os estados isentem de ICMS produtos da cesta básica. Sobre essa demanda, o vice-presidente Alckmin argumentou na última quinta-feira (13/3) que o governo federal não vai obrigar os estados a fazerem isso por meio de lei, mas considerou que a medida ajudaria.
“Tanto é uma medida correta que foi aprovada na reforma tributária por unanimidade — não tributar cesta básica. É que a reforma tributária não entra em vigência amanhã, mas isso vai desaparecer, não vai ter mais ICMS sobre alimento, não vai existir mais. Nós estamos falando de uma questão transitória”, completou.
O governo federal já não tributa os alimentos, ou seja, não há incidência de PIS/Cofins.
Tarcísio após governo apelar para zerar ICMS: “Fiz o dever de casa”
Nessrallah reforça que a tributação impacta os preços, mas não deve ser vista como o único fator determinante. “O ICMS tem peso significativo, mas produtos essenciais já contam com benefícios fiscais. Além disso, custos como frete e energia também influenciam a formação dos preços. Para um impacto mais expressivo, o ideal seria uma estratégia econômica mais ampla, e não apenas ajustes tributários pontuais”, destaca.
De acordo com o advogado tributarista André Felix Ricotta de Oliveira, os estados não podem conceder unilateralmente a isenção do ICMS. “Para isso, é necessário aderir a um convênio do Confaz, pois qualquer benefício tributário no ICMS precisa dessa autorização. Atualmente, apenas 12 estados têm essa legitimidade, entre eles o Ceará. Já os estados que não aderiram ao convênio não podem isentar toda a cesta básica”, explica.
Além disso, Oliveira destaca que o ICMS é um tributo indireto, ou seja, seu custo é repassado ao consumidor final, pois incide sobre produtos.
“Ao isentar produtos da cesta básica desse imposto, há uma tendência de redução dos preços, pois a carga tributária deixa de ser repassada. No entanto, os estados precisam compensar essa perda de arrecadação conforme a Lei de Responsabilidade Fiscal, o que pode gerar aumento de tributos em outros setores”, alerta.
Mais subsídios para agricultura familiar
Sobre a ampliação dos subsídios para a agricultura familiar e médios produtores, a especialista Salwa Nessrallah vê a medida como positiva, mas ressalta a necessidade de um planejamento mais amplo.
“Considerando que 77% dos estabelecimentos agrícolas são classificados como agricultura familiar, qualquer estímulo pode ter um impacto relevante. No entanto, para resultados efetivos, é essencial que esses incentivos sejam bem direcionados e acompanhados de ações estruturais complementares”, conclui.
🛑 Redação com Metrópoles