Por: Luísa Marzullo e Bruno Alfano
Em meio a um clima de tensão entre o governo do Paraná e professores estaduais, a Assembleia Legislativa do estado aprovou em primeiro turno o projeto de lei “Parceiro da Escola”, que visa entregar a administração de duzentas escolas da rede estadual para a iniciativa privada. Os parlamentares paranaenses voltam a discutir o PL nesta terça-feira, a partir das 14h.
O texto recebeu o aval de 39 parlamentares ontem, após ser enviado governador Ratinho Júnior (PSD) à Casa. A motivação é uma greve dos servidores da educação no estado. A sessão foi marcada por confusão, e foi interrompida após manifestantes invadirem o plenário. Diante da mobilização, o presidente Ademar Traiano (PSD) suspendeu os trabalhos, que foram reestabelecidos de forma remota às 17h. Apenas parlamentares da oposição acompanharam do plenário.
Além do Paraná, a proposta de contratação de instituições privadas para administrar colégios públicos avançou também em São Paulo. A medida, que tem resistência de partidos de oposição e do sindicato de professores, também é estudada em Minas Gerais.
A ideia do governo de Ratinho Júnior, no Paraná, é escolher escolas particulares para serem responsáveis por manutenção predial, controle de faltas, contratação de professores temporários e outras funções burocráticas, enquanto o diretor — um servidor da rede — se dedicará mais a cuidar apenas do projeto pedagógico.
Lá, dois colégios pilotos já são administrados dessa forma desde o ano passado. Agora, o plano chegou à Assembleia Legislativa do estado para que o modelo seja ampliado para 200 escolas, o que representa 9% da rede.
Em entrevista ao GLOBO no mês passado, o secretário de Educação do estado, Roni Miranda, explicou que esse modelo será implementado apenas em escolas com baixo índice de aprendizagem e alta evasão. O programa prevê ainda que essas unidades tenham pelo menos 450 alunos e que uma assembleia formada por professores, pais e funcionários aprovem a privatização da administração do colégio. Em 2023, na criação do projeto piloto, 27 escolas foram consultadas e só duas aceitaram a novidade.
— No momento em que a gente fez a consulta, as pessoas não conheciam o modelo, e isso gerou insegurança. Mas funcionou nas duas escolas em que implementamos. Houve um aumento significativo na proficiência e na presença dos alunos — defende o secretário. — Esse é um modelo para algumas unidades só. Não é para a rede toda. Temos alguns colégios que são excelentes, têm qualidade de escolas privadas já.
Caso o projeto seja aprovado, as empresas serão escolhidas por licitação e cada uma administrará um grupo de escolas, divididas em lotes. Elas receberão até R$ 800 mensais por matrícula. Miranda afirma que esse é o valor médio gasto por estudante no estado. Nas escolas que tiverem ainda professores concursados ou outros gastos pagos pelo estado, essa diferença será descontada do valor do contrato repassado às empresas. Além disso, o estado pagará bônus por desempenho, analisando diminuição de abandono escolar e melhoria nas notas do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb).
— Esses contratos serão de 12 meses renováveis por mais quatro anos, mas a gente pode rescindir a qualquer momento no caso de o contratado não entregar os resultados em frequência e melhoria no Ideb — afirmou Miranda.
O lucro financeiro alcançado pelas empresas privadas resultará do quão bem elas conseguirão administrar a verba repassada pelo estado, segundo o secretário — ou seja, o que ela conseguir economizar com o pagamento pela prestação de serviços. Miranda avalia que os contratos costumam ser mais caros quando feitos pela esfera pública. O titular da Educação ressalta ainda que há travas que impedem as empresas de prestarem serviços de baixa qualidade. Entre eles, estão prazo para contratação de professores temporários, garantia de três refeições diárias, limite de alunos por turma e fiscalização dos produtos da merenda por nutricionistas da rede.
— O diretor da escola, que será sempre um funcionário da rede, ficará como fiscal deste contrato, observando os serviços — diz o secretário.
Disputas
A medida, no entanto, tem enfrentado resistência na oposição — formada por partidos de esquerda no estado — e pelo sindicato dos professores. De acordo com a Associação dos Professores do Paraná (APP) — que decretou a greve —, o governador quer “acabar com a escola pública”. Ainda na avaliação do sindicato, a lógica da empresa privada é obter lucro, o que seria incompatível com a administração de uma escola pública. “Isso se dá cortando custos, reduzindo direitos e salários de funcionários(as) e professores(as) e, no caso deste projeto, obtendo os índices para aferir mais bonificação. A pressão sofrida nas escolas será ainda maior do que já se sofre hoje”, argumenta o grupo.
Atualmente, outros estados estudam modelos similares ao do Paraná. Em São Paulo (leia mais abaixo), 33 escolas serão construídas e depois geridas por 25 anos por uma parceria público-privada, conforme edital que está sendo elaborado.
Já em Minas Gerais, o estado entregou, ainda em 2022, tanto a gestão administrativa quanto a pedagógica de três escolas a uma entidade sem fins lucrativos. De acordo com a secretaria de Educação do estado, foram definidos indicadores para avaliar periodicamente a gestão e o desenvolvimento dos alunos, incluindo índice de aprovação, reprovação, frequência, evasão/abandono, satisfação da comunidade escolar, dentre outros índices.
“De forma geral, dados preliminares demonstraram que as escolas participantes do projeto atingiram as metas definidas. Além disso, houve um destaque na gestão das informações escolares e na participação dos estudantes no programa de intervenção pedagógica e avaliações internas”, afirmou em nota a secretaria.
A proposta de mudança na rede
- Como: no Paraná e em São Paulo, as entidades privadas serão responsáveis pela área administrativa, liberando o diretor para atuar na parte pedagógica. Já em Minas Gerais, a gestão das duas áreas estão nas mãos da entidade da sociedade civil.
- Quem: o governo do Paraná quer contratar escolas privadas para administrar as públicas. Já em MG a ideia é usar entidades civis sem fins lucrativos. Em São Paulo ainda não há definição sobre que tipo de gestão será aplicada.
- Quantas: o Paraná prevê até 200 escolas (9% da rede) incluídas no projeto. A comunidade escolar ainda será consultada. São Paulo construirá 33 novas unidades escolares e o projeto-piloto de MG trabalha apenas com três colégios.
- Quando: o projeto paranaense foi enviado para análise na Assembleia Legislativa do estado. Em São Paulo, o leilão para a escolha dos contratados será em setembro. E Minas Gerais ainda está testando o modelo em unidades piloto.
*Redação com O Globo