“Bolsonaro taxou você.” A frase que viralizou na rede X após o ex-presidente articular o apoio de seu partido, o PL, para aprovação do “jabuti” da taxação das blusinhas no PL 314/2024, que institui o Programa Mobilidade Verde e Inovação (Mover), provocou a ira de Jair Bolsonaro (PL), dos filhos e do núcleo duro de aliados.
Adepto por ocasião do neoliberalismo, quando aceitou Paulo Guedes como avalista do mercado e da mídia liberal em sua candidatura de 2018, Bolsonaro tem como uma das principais bandeiras o extermínio de impostos – o que resultou na dinamite das contas públicas, que explodiu no colo de Lula.
A adesão às pautas neoliberais, no entanto, fez com que parte da burguesia brasileira se alinhasse ao ideário neofascista do ex-presidente.
Desde sempre é assim: o apoio da burguesia se compra com benesses. E foram essas benesses, especialmente na questão tributária, que fizeram com que Bolsonaro cooptasse essa pequena parcela de endinheirados do Brasil, sempre dispostos a extrair sangue para aumentar os lucros.
Na mensagem enviada aos 95 deputados do PL, lida pelo líder Altineu Cortes (PL-RJ), Bolsonaro falou em nome dessa burguesia, atendendo a um pedido direto de Luciano Hang, o véio da Havan – que montou um império que destrói pequenos comércios pelo Brasil afora, mas não tem fôlego para competir com as bugigangas vendidas em sites chineses como Shein e Shopee.
Ignorante confesso em economia, o “capitão” sabe como ninguém fazer politicalha e age com o fígado, como demonstrou com o fiscal do Ibama que o multou por pesca irregular e como “comandante em chefe” das mesmas Forças Armadas, que o escorraçaram em 1988, entre outros tantos casos.
E, agindo com o fígado, Bolsonaro provocou a implosão do grupo de Arthur Lira (PL-AL) em Alagoas na estratégia do clã para se vingar de Lula e do campo progressista, que o responsabilizou pela aprovação do “jabuti” da taxação das blusinhas na Câmara.
“Bolsonaro taxou você”
Tão logo explodiu nas redes sociais – um território dominado pela extrema direita – a responsabilização por taxar as compras nos sites chineses, Bolsonaro foi ao X tentar se justificar.
“Informo que o meu governo sempre foi contra qualquer taxação, majoração ou criação de novos impostos. Portanto, somos contrários a qualquer projeto que onere ainda mais o cidadão brasileiro”, escreveu, em mensagem sucinta que não surtiu efeito.
Especialista do clã nas redes, Carlos Bolsonaro (PL-RJ) criou a primeira estratégia de lançar a “campanha veta Lula”, desafiando o presidente a vetar o imposto aprovado pelo Congresso sob articulação de seu pai.
A estratégia, no entanto, naufragou já que Lula havia sinalizado que poderia realmente vetar o imposto. Além disso, a ação de Carlos caiu como uma bomba entre os aliados empresários, que continuariam com o ônus da concorrência com os sites.
Ação de Flávio Bolsonaro
Após o fracasso de reverter a situação nas redes, o que aumentou a ira do presidente, o PL com o “jabuti” foi colocado em regime de urgência para votação no Senado a pedido de líderes partidários.
Há um consenso entre os partidos sobre a necessidade da taxação ‘das blusinhas’, devido à concorrência desleal com a indústria nacional. E tudo se encaminhava para que o projeto fosse aprovado com facilidade no Senado.
No entanto, ainda havia a vingança do clã Bolsonaro na trilha.
Pegando até mesmo o “aliado” Arthur Lira de surpresa, o relator Bruno Cunha (Podemos-AL) anunciou nesta terça-feira (4), antes da votação no plenário do Senado, que havia retirado o “jabuti” da taxação do PL 314/2024.
Sem entender, Lira ligou para reclamar com o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, que informou que o presidente da Câmara havia batido em porta errada. Não partiu do governo o rompimento do acordo costurado no Congresso que estipulou os 20% nas compras até 50 dólares nos sites chineses.
Toc-toc
Um dia antes, Lira se encontrou em Brasília com o prefeito de Maceió, João Henrique Caldas, o JHC (PL), figura de seu grupo político.
A viagem de JHC a Brasília foi para comunicar Lira sobre o rompimento de um outro acordo: de que não aceitaria mais a indicação do presidente da Câmara do nome do vice na chapa para a tentativa de reeleição na capital alagoana.
O prefeito de Maceió – que em 7 de outubro de 2022 deixou o PSB, de Geraldo Alckmin, para embarcar no PL, de Bolsonaro – teria informado que seu vice será o senador Bruno Cunha, implodindo o grupo comandado por Lira no estado nordestino.
Ao se candidatar a vice, Cunha deixará o cargo no Senado nas mãos de Eudocia Caldas, mãe de JHC, que vai fortalecer a bancada do PL na casa.
Há cerca de um mês, no início de abril, JHC teria recebido as bênçãos de Jair Bolsonaro para ser o candidato da extrema direita nas eleições de outubro.
A articulação que implodiu o acordo com Lira, ao que tudo indica, contou com a participação do ex-presidente.
A estratégia ficou ainda mais clara após a reunião de líderes do Senado, na noite desta quarta, depois que Pacheco resolveu adiar a votação do PL do Mover.
Em dobradinha com Carlos Portinho (PL-RJ), líder do PL no Senado, Flávio Bolsonaro (PL-RJ) tenta encurralar o governo na taxação ‘das blusinhas’, deixando claro que a vingança do ex-presidente passou por cima até mesmo de Lira.
Na entrevista após a reunião, Flávio afirmou que, agora, vai brigar para que produtos nacionais também tenham alíquotas reduzidas e não paguem mais do que 20% de tributos.
“A oposição entende que o melhor caminho é a emenda que foi apresentada por mim de desonerar o custo da indústria nacional como uma forma de deixá-la mais competitiva em relação à indústria chinesa. […] Como não abrimos mão disso, queremos que haja o reequilíbrio não aumentando uma taxação dos produtos importados, mas reduzindo a taxação sobre a indústria nacional”, disse o filho de Bolsonaro.
A emenda, que vai conturbar a votação do PL Mover, de extremo interesse do governo, representa uma mudança de posição do clã Bolsonaro, que antes tentava simplesmente derrubar a taxação negociada pelo próprio ex-presidente junto aos deputados do PL.
Com a mudança de estratégia, Bolsonaro e seus filhos tentam emparedar o governo. A emenda de Flávio, de baixar impostos na indústria nacional, impacta diretamente nas contas públicas em um momento em que o governo Lula e Fernando Haddad lutam para aumentar a arrecadação.
Fora do jogo, inelegível até 2030, Bolsonaro antecipa as eleições de 2026 antes mesmo do pleito municipal de outubro ao defender a redução de impostos para uma burguesia sedenta de lucros e que já aderiu ao fascismo para isso.
A medida lembra, em parte, as pautas-bomba instaladas por Eduardo Cunha em 2016, que culminaram no golpe contra Dilma Rousseff (PT).
Com a emenda, o clã Bolsonaro coloca mais uma vez uma bomba no colo de Lula, em meio a um cenário de guerra no Congresso Nacional e em uma conjuntura política e midiática pouco favorável.
Bolsonaro mostra que não tem escrúpulos nem com os aliados, como Lira. E lembra o voto no golpe, quando homenageou o torturador Carlos Alberto Brilhante Ustra. Bolsonaro agora tortura não o governo, mas os mais de 215 milhões de brasileiros que não fazem parte dos beneficiados pela sua politicalha.
Fonte: Revista Forum